Drama. Na pastelaria onde farão a festa de lançamento do livro de poemas
que escreveram juntos, os amigos de infância Rivaldo Torres e Teodoro
Xavier vão aos poucos recebendo seus convidados. De um sujeito que
Rivaldo livrou do suicídio no Viaduto do Chá, passando por músicos,
prostitutas, parentes, até o editor do livro e sua noiva, vem chegando
todo tipo de gente para a festa, regada a música e recordações. Assim, a
amizade dos autores, iniciada nos anos 60, é revivida em seus
principais momentos: as namoradas de infância e entradas gratuitas no
cinema; o grupo de rock de Xavier e a perda da virgindade de Rivaldo, na
adolescência; a paixão de Rivaldo pela prostituta Anésia, de quem
fingiu ser noivo para que a família dela não desconfiasse; até a
aproximação com os grupos de esquerda durante a ditadura militar, da
qual Rivaldo logo se afastou após apaixonar-se pela companheira Eliane,
que o abandonou. O desenrolar da festa torna-se, então, uma volta ao
passado, em que Rivaldo, mais do que alimentar lembranças, terá enfim
fechado um ciclo.
Lirismo e nostalgia marcam esse filme do
diretor Carlos Reichenbach, dedicado à "geração que privilegiava as
sensações absolutas, a amizade e a fé na utopia". No caso de Rivaldo e
Teodoro, uma geração cuja erudição mais afastou do que levou ao
engajamento social, onde a ânsia pela vivência e pela experimentação era
o que mais havia de bom. Em Rivaldo, principalmente. Menino pobre com
todas as limitações de sua condição, passou a maior parte da vida à
sombra do amigo, rico e bem sucedido com as mulheres, o que certamente o
fez dar mais valor a cada conquista obtida, fosse profissional ou
amorosa. A tentativa fracassada de unir-se aos grupos esquerdistas (cujo
cotidiano absurdo movido sobre discursos ideológicos rende os melhores e
mais engraçados momentos do filme), para ele, era prova de sua condição
de maldito, cujo destino estaria escrito desde a infância, quando pela
primeira vez vislumbrou a silenciosa mulher de preto que o acompanharia
por toda a vida, da mesma forma que a incômoda (para os outros) tosse, a
quem não deu a devida atenção.
Autor
que não teme se expor em seus filmes (dos quais deve ter total domínio,
já que assina não apenas o roteiro e a direção, mas também a música e a
fotografia), Reichenbach narra com uma simplicidade e leveza que muitas
vezes parecem ingênuas, e ainda assim obtém instantes de poesia e
profunda introspecção, proporcionando também pequenas surpresas como uma
passagem do tempo conduzida por uma anãzinha dançarina, ou um belo solo
de piano tocado por um negro de aparência propositadamente humilde. Seu
personagem Rivaldo, frágil, romântico e porralouca, encontraria na
figura de Bertrand Duarte uma encarnação perfeita do poeta marginal,
inteligente, talentoso e duro. Que, na hora de olhar para trás, deve
certamente ter se dado conta de que sua vida foi muito mais rica do que
imaginava.
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